Bem-vindos à casa do imperador: conheça a história do Museu Nacional do Rio

Por Cadu Belo 

Fotos por Bárbara Costa e Thiago Maia

Se você é noveleira ou noveleiro de plantão, certamente se encantou com “Nos tempos do Imperador”, telenovela ambientada no século XIX, durante a regência do Imperador Dom Pedro II. Exibida no tradicional horário das 18h na Rede Globo de Televisão, ela trouxe a nostalgia do período monárquico brasileiro, misturando pitadas de ficção com a história verdadeira de nosso país. 

Na trama escrita por Thereza Falcão e Alessandro Marson, o público pôde ter um gostinho do que seria viver no Palácio de São Cristóvão, que mais tarde viria a abrigar o Museu Nacional, e se tornar, até o trágico incêndio de setembro de 2018, um dos mais importantes museus da América Latina.  

O incêndio de setembro de 2018 

02 de setembro de 2018. Era por volta de 19h38 quando se iniciou, através de um curto-circuito num ar-condicionado no pavilhão térreo do museu – de acordo com laudo técnico da Polícia Federal -, um trágico incêndio que derreteria mais de 85% dos 20 milhões de itens do Museu Nacional do Rio. Para qualquer um que viesse a sintonizar nos canais de notícia em plena noite de domingo, o choque ao se deparar com a proporção gigantesca do fogo que consumia o Palácio de São Cristóvão era inevitável. 

O desespero tomou conta de todos os funcionários e professores que ali trabalhavam, pois o Museu era vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). 

Ainda, esses funcionários chegaram ao local na tentativa de ajudar o corpo de bombeiros na luta para extinguir as chamas, mas a falta de infraestrutura adequada ficou evidente, visto que nem os hidrantes do local tinham água. Enquanto os bombeiros militares faziam manobras para trazer água do lago que fica no Parque da Quinta da Boa Vista, onde se localiza o Palácio, a tensão só aumentava durante a espera de caminhões-pipa.  

O incêndio de enorme proporção só foi extinguido por volta das 3h da madrugada de segunda-feira. Grande parte da história do Brasil virou pó, principalmente materiais mais sensíveis como o crânio de Luzia, o mais antigo fóssil humano já encontrado na América do Sul; e a coleção da Imperatriz Maria Tereza Cristina, que tinha artefatos trazidos de Pompéia e Herculano no sul da Itália. 

Histórico do Palácio de São Cristóvão (Casa do Imperador) 

Por volta do ano de 1803, foi erguido no alto de uma colina nos arredores da cidade do Rio de Janeiro um enorme palacete pelo Senhor Elias Antônio Lopes, um mercador de pessoas pretas escravizadas. Com a chegada da Família Real ao Brasil, o negociante doou o palacete ao então Príncipe Regente Dom João VI, que o utilizou como Residência Oficial da Coroa no Brasil. 

O palacete tinha a mais bela vista da cidade e da baía de Guanabara. Essa beleza viria a batizar o nome do local futuramente, sendo hoje conhecida como Quinta da Boa Vista. Desde a chegada dos novos inquilinos, em 1808, o palacete passaria ainda por sucessivas reformas para se tornar uma residência Real. 

Com o advento da independência, o Palácio Real tornou-se o Palacete Imperial onde morou o Imperador Pedro I e sua família. No Palácio Imperial nasceu, cresceu e viveu nosso último monarca, o Imperador Dom Pedro II, que também realizou reformas com destaque para a ampliação e embelezamento dos jardins externos com a ajuda dos nobres da Corte. 

De acordo com a historiadora Regina Dantas, a “moradia do imperador era dividida em três pavimentos: o primeiro era destinado a serviços gerais e primeiras recepções; o segundo era um pavimento mais ornamentado que tinha como função receber os visitantes; e o terceiro era constituído de dormitórios e demais áreas da família”. 

Destacava-se em sua lateral o Jardim das Princesas. Inclusive, é importante mencionar que nessa residência nasceram as Princesas Isabel e Leopoldina, que viveram ali por anos até o nascimento de seus filhos. O Palácio de São Cristóvão deixou de ser a casa do Imperador e de sua família apenas em 1889, com o advento do golpe militar que instituiu a República e extraditou a Família Imperial brasileira, encerrando assim o período monárquico de nossa história. 

Gênese do Museu Nacional (sediado inicialmente no Campo de Santana) 

O Museu Nacional tem seu nascimento ainda no século XIX. Foi criado por Dom João VI em 1818 e ocupava um casarão no Campo de Santana, lembrando que sua sede atual, na época, era a residência da família do monarca. 

Seu acervo foi construído ao longo dos anos e teve como maiores apoiadores o Imperador Dom Pedro II e sua esposa a Imperatriz Maria Tereza Cristina, que solicitava aos seus parentes na Europa o envio de peças que pudesse integrar ao conjunto. Os Imperadores também realizaram sucessivas expedições pelo Brasil na busca de artefatos culturais da população indígena brasileira e relíquias da mineralogia. 

Em suas viagens mundo afora, os monarcas conseguiram formar a mais importante coleção de obras do Egito Antigo na América Latina, deixando um enorme legado para o Museu e para a comunidade científica do Brasil. 

O Museu Nacional ocupou a sua nova sede em 1892 e lá permanece até os dias atuais. O edifício foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), em 1938, e vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 1946. 

Vale a pena visitar o site do Museu Nacional que apresenta o andamento das obras e as parcerias com a sociedade e com as instituições empresariais e políticas na suada tentativa de restaurar e soerguer a Instituição. Nesse passeio virtual, podemos adentrar as salas e o acervo das exposições do museu antes do incêndio de 2018, pelo Google Arts and Culture.

O Museu hoje e por onde “andam” as peças e obras de arte que resistiram ao incêndio 

Algumas peças importantes do acervo já foram encontradas, identificadas e passam por avaliações dos técnicos e alunos dos programas de pós-graduação e professores da UFRJ ligados aos departamentos do Museu. Como, por exemplo: 

Partes do crânio e fêmur de Luzia já foram encontradas nos escombros do incêndio. Achado importante, pois, esse esqueleto revolucionou as teorias científicas sobre a ocupação do continente Americano. Ainda, blocos com vértebras do Dinossauro do Mato Grosso, importante achado científico brasileiro, com mais de 80 milhões de anos, também foram encontrados. 

Entre os achados, há o meteorito de Bendegó, que ficava no hall de entrada do Museu, e que pesa aproximadamente cinco toneladas. O corpo espacial foi encontrado em 1784 no sertão da Bahia. É o maior meteorito brasileiro e um dos maiores do mundo e, só chegou ao Rio de Janeiro em 1888, dadas as dificuldades logísticas da época. Recebido pela Princesa Isabel, a peça foi entregue ao Arsenal de Marinha da Corte. 

Foram achados parte dos ossos, do caixão e amuletos da Múmia Sha-Amu-em-Su, umas das peças mais importantes da coleção de Arte Egípcia do Museu, considerada uma das maiores do mundo. A Múmia de cerca de 2.800 anos ficava no escritório de Dom Pedro II, quando a família Imperial residia no Palácio. Além de estatuetas e vasos da coleção foram encontrados também fragmentos da Estrela de Itu (1307 a 1196 a.C). A instituição possuía 53 dessas peças que são lajes em rocha ou madeira, usadas como epitáfio para enfeitarem monumentos. 

É fato que diante de um incêndio de grandes proporções como o ocorrido, somente materiais mais resistentes estariam intactos ou com estragos leves. A maior parte do acervo era composta por peças raras e de materiais sensíveis como amostras da fauna e da flora, fósseis, tecidos e múmias, fazendo com que grande parte da história tenha virado pó. 

Uma enorme cobertura metálica protege o teto e toda a fachada do prédio para que os trabalhos de resgate das peças continuem. Até o momento, somente a fachada principal e os jardins externos foram reformados.  

Desde 2018 foram arrecadados 65% do valor orçado para a recuperação total do Museu avaliada em 385 milhões. A maior parte dos recursos veio do BNDES e da Fundação Vale, e o projeto segue sendo administrado pela Associação dos Amigos do Museu Nacional. 

Todas as peças resgatadas dos escombros estão sendo guardadas nos prédios anexos ao Palacete onde ficavam as reservas técnicas do museu. Devido ao espaço reduzido por conta da pandemia da Covid-19 e a limitação dos recursos financeiros, os profissionais e estudantes estão em esquema de revezamento, e as aulas dos cursos de extensão e pós-graduação, em sua maioria, continuam no formato on-line.  

As exposições foram suspensas por período indeterminado de acordo com o site oficial da instituição e, questionada sobre os estados de conservação das obras de artes e peças resgatadas dos escombros do incêndio, a assessoria de imprensa limitou-se a responder que “Por enquanto não temos um material para você. Na semana que vem, o Museu participará do aniversário de Madureira. Assim que tivermos tudo fechado, encaminhamos para você”. 

Até o fechamento da matéria não recebemos mais informações da assessoria e também não sabemos como será essa participação no aniversário de Madureira (bairro da zona norte da cidade do Rio). 

22 comentários sobre “Bem-vindos à casa do imperador: conheça a história do Museu Nacional do Rio

  1. Quero parabenizar o Cadu Belo e toda equipe, pela sensibilidade e compromisso com a história da nossa Pátria amada.
    São trabalhos como este que desperta no coração dos brasileiros a vontade de fazer a escolha certa e resgatar os valores da nossa nação. 🤝

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    1. Sensibilidade primeira de nossos Imperadores e Imperatrizes que deram o ponta pé inicial para construir todo o acervo e incentivar as pesquisas e o conhecimento científico em nosso país. Obg e acompanhe nossas matérias!

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  2. Que ótima matéria sobre o museu Nacional,não conheço o Rio de Janeiro mas depois de ler sobre a curiosidade aflorou pra conhecer esse importante acervo histórico do nosso país. Parabéns a todos os envolvidos e a iniciativa da faculdade de formar este site, abraços de um estudante da UFPE.

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  3. Muito triste esse incêndio,mais triste ainda e essa ONG que está acabando com o dinheiro que seria para o restante das reformas …ONG COMPRA IATES,APARTAMENTOS…. ISSO É PARA A REFORMA??

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