Por Rorion Carvalho
A importância do corpo e as mensagens que ele transmite foram o foco da palestra “O Corpo como Objeto de Transformação na Produção Audiovisual”. Iniciada com exibições de videoarte do casal Patrícia Niedermeier e Cavi Borges, as obras são sobre expressões corporais e experiências cinematográficas. Nas palavras de Patrícia, os curtas realizados em suas viagens pela Europa são “exercícios de liberdade”.
Para ela, o descobrimento do que hoje é realizado enquanto atriz remonta de sua trajetória e as trocas obtidas através de contato com outros artistas. Essas trocas a marcaram muito, pois o processo criativo tem que ser livre. “E a partir dessa liberdade a gente descobre coisas, se coloca no território desconhecido pronto para descoberta. A gente não tem obrigação de acertar. A gente tem o desejo de estar em movimento”. E coloca dentro de seu aprendizado que o corpo é o instrumento do ator. Pois o corpo é a ferramenta e o repertório para experimentar, incorporar, encarnar, sentir, escolher e brincar. “Pois o corpo é uma forma consistente”. Formada em dança contemporânea pela Angel Vianna, Patrícia diz que essa formação a ajudou na sua pesquisa sobre o assunto. Já que a dança “é muito vasta e tem um corpo. E é no corpo onde estão as emoções. As memórias, os pensamentos, onde tudo começa”.
Para ilustrar a potência que é a manifestação corporal, Patrícia relembra algumas de suas intervenções artísticas feitas na rua. Uma delas, chamada “Cabelos”, consistia na reflexão da questão do tempo, das transformações que o tempo trás, e como essa parte do corpo sempre está em mutação. E essa performance propunha um encontro com outra pessoa junto de objetos de corte como tesouras, navalhas etc. Em suma, “foi uma experiencia divisora de águas, pois o corpo (está ali) em seu estado de presença, sem movimentos, onde a corporalidade te leva para estados desconhecidos e te conecta profundamente em estado pré-verbal, que traz emoções, uma conexão muito forte (com o outro)”. Compreendendo que até a atividade mais simples que é observar o outro gera emoções e sentimentos.
Aprofundando sobre o tema da palestra em si, Patrícia apresenta o ‘Sistema Laban’. De maneira sucinta esse Sistema consiste na observação e consequente descrição do movimento humano. “O Sistema Laban vai te dar ferramentas e vocabulários para trabalhar com objetos, corpos, pessoas, ideias, atores. É muito usado por coreógrafos, bailarinos, políticos, atores. Usado por todo mundo que quer se comunicar”, pois está na vida a partir sobre o que a corporalidade informa ao outro, completa. É uma forma sistema de descrever e experimentar a comunicação não verbal. É um estudo do corpo e do movimento e as leituras criadas a partir do que se vê.
Esse sistema possui 4 pilares; corpo, forma, espaço e esforço (qualidade de movimento). As coisas sutis e simples como respirar, direcionar o olhar ou piscar, movimentos simples que informam ao outro sobre desejos e sensações. Com relação ao corpo, Patrícia diz que no Sistema Laban “pequenas mudanças de gesto e postura mudam completamente nossa percepção de forma consciente ou inconsciente”. Ela dá o exemplo sobre gestos de cabeça. Se levantar muito nariz, a pessoa pode passar a impressão de arrogância, assim como se a cabeça estiver muito abaixada, a percepção pode ser de insegurança ou receio. E essas leituras serão feitas das mais diferentes formas, dependendo do ambiente em que se está inserido e a dinâmica psicossocial proeminente ali. O pilar ‘espaço’, no ‘Sistema Laban’, trabalha com ‘direto’ e ‘indireto’, onde falar diretamente olhando para uma pessoa na plateia, por exemplo, é direto e olhar para o espaço como um todo, mas não diretamente a alguém seria a utilização indireta do espaço. Em termos de cinema é a relação do corpo com o espaço.
Fechando a conversa, Patrícia cita Maya Deren como inspiração para muitas de suas obras recentes, em especial as apresentadas no início da palestra. Deren foi “uma cineasta que acreditava o cinema como forma de arte. Foi a primeira diretora a investigar o corpo, movimento e a dança no cinema”, comenta. Um corpo atravessado por intensidade em estado pulsante, complementa, “criando uma indissociável entre arte e pensamento.”
Do encontro fica sempre a reflexão da importância do corpo nas produções do audiovisual. Entendido que como principal ferramenta para que essa indústria funcione, o corpo abre espaço de discussão para várias subáreas dentro da área do cinema. Mas de forma restrita ao ator, cerne do encontro, sobre como o movimento, voz, expressões e presença são fundamentais para que sensações sejam criadas em que assiste algo, assim como na vida que é encarnada por quem atua, gerando a vida do personagem e história que chamamos de filme.
