O Dia Internacional do Jazz e a importância do seu legado

Foto Capa: reprodução/radio france

Por Marcelo Carvalho

No  dia 30 de abril, o mundo entra em sintonia com o som da liberdade e celebra  o dia internacional do jazz. A data foi criada pela UNESCO como homenagem  às raízes afro-americanas que deram origem a essa arte universal tão importante.

Louis Armstrong (créditos: reprodução/Vatican News)

Jazz: Liberdade, Linguagem e Improviso

O jazz é muito mais do que um simples estilo musical, é  emoção, resistência e alma. Nasceu  da dor e da luta pela  liberdade de um povo, que transformou o sofrimento em arte. Toni Morrison em seu romance, Jazz ,define bem esse sentimento; “ O jazz  vai além da música: é memória viva, é linguagem do corpo , é expressão do espírito”. Cada nota improvisada, carrega a ancestralidade de quem resistiu, amou e dançou mesmo diante de tanta opressão.

Mas, afinal, o que é o jazz?

Nascido nos Estados Unidos no fim do século XIX e início do século XX, o jazz floresceu em Nova Orleans como forma de expressão das comunidades afro-americanas, refletindo sua cultura, vivência e espiritualidade.

É marcado principalmente pela improvisação, por linhas de baixo marcantes,  pelo swing (um tipo de balanço rítmico), pelas síncopes irregulares que quebram o ritmo tradicional e por harmonias complexas, ricas em dissonância . Um de seus traços mais característicos  é a blue note ; nota musical originária do blues  que transmite uma profunda sensação de melancolia e intensidade emocional.

Ao longo do tempo, o jazz foi influenciado por diversos estilos, como o blues, o ragtime, a música africana, a música europeia e os cânticos religiosos, como o gospel. Assim, tornou-se um gênero musical dinâmico, em constante transformação, que carrega em sua essência a mistura de culturas, sons e histórias.

New Orleans (créditos: reprodução/library of congress)

A Importância Cultural do Jazz

O jazz é um dos gêneros musicais mais ricos da história, tanto pelo seu valor artístico quanto pelo seu impacto cultural. Alguns pontos fundamentais que destacam sua importância são :

  • expressão da liberdade e criação: O jazz valoriza a improvisação, dando aos músicos liberdade para criar e se expressar de forma única, revolucionando a maneira como a música é pensada e executada.
  • raízes culturais: É um reflexo da luta, resistência e identidade das comunidades afro-americanas.
  • influência musical: Influenciou e moldou diversos gêneros, como rock, pop, funk, rap, bossa nova, hip hop e até a música clássica contemporânea.
  • inovação: Introduziu novas estruturas harmônicas, rítmicas e melódicas, desafiando as convenções da música ocidental tradicional.
  • engajamento social e político: Foi voz ativa nos movimentos pelos direitos civis e contra o racismo, servindo como ferramenta de resistência e afirmação cultural.
  • impacto global: Embora tenha raízes americanas, o jazz é um fenômeno mundial, adaptando-se às culturas locais sem perder sua essência.
Charlie Parker (Bird) e Dizzy (créditos: reprodução/morrison hotel galery)

Linha do Tempo do Jazz: Uma Jornada da Evolução

1890 – 1910: Origens

Pós-abolição em Nova Orleans; fusão de blues, ragtime e espirituais africanos

Destaques : Jelly Roll Morton, Scott Joplin.

1920 – 1929: Jazz Age

Os “Roaring Twenties” e o Harlem Renaissance consolidam os estilos de New Orleans e Dixieland.

Destaques: Louis Armstrong, Sidney Bechet, King Oliver.

1930 – 1945: Swing & Big Bands

Era da Grande Depressão e Segunda Guerra Mundial; auge das orquestras e grande popularidade.

Destaques: Duke Ellington, Count Basie, Benny Goodman, Billy Holiday, Lester Young.  Início da integração racial.

1945 – 1955: Bebop e sua revolução

Pós-guerra; busca de virtuosismo e elevação artística.

Ícones: Charlie Parker (Bird) e Dizzy Gillespie reescrevem a linguagem do jazz , promovendo uma verdadeira revolução do estilo , o album live at carnegie hall de 1947 é um marco . Outros nomes importantes; Bud Powell, Thelonious Monk, Sarah Vaughan,  , Ella Fitzgerald, Max Roach, Clifford Brown.

1950 – 1965: Cool, Hard Bop e Jazz Modal

Sofisticação e espiritualidade .

Miles Davis trás sofisticação para o gênero com o álbum Birth of cool (1957). Em 1959  Miles  grava o Kind of blue , o álbum mais vendido da história do jazz e estabelece um novo marco com o seu jazz modal, onde a música se desenvolve em torno do tom e permite mais liberdade ainda para o improviso. Dave Brubeck  lança o Time Out” (1959) e agrega lirismo e ritmos de outras culturas. “Mingus Ah Um” (1959) de Charles Mingus  aponta para arranjos complexos  e mensagem social. O lançamento de “A Love Supreme” de John Coltrane, (1965) é um divisor de águas; une a espiritualidade oriental e ocidental com a liberdade e o virtuosismo.

Outros nomes: Bill Evans, Art Blakey,  Chet Baker,  Stan Getz.  Wayne Shorter.

1960 – 1970: Free Jazz & Vanguarda

Rompimento com padrões estéticos tradicionais, engajamento político.

Destaques: Ornette Coleman, John  Coltrane,  Eric Dolphy , Sun Ra, Albert Ayler, Cecil Taylor.

1970 – 1985:  Fusion , do acústico ao elétrico

Com o sucesso mundial do rock , muitas casas de jazz fecham e surge a necessidade do gênero  se  reinventar . A fusão com outros estilos como o  rock e o funk; promovem maior apelo comercial e sobrevida para o jazz.

Lançamento marcante: o álbum Bitches Brew,(1970) de Miles Davis, é a pedra fundamental do Fusion.

Outros artistas importantes: Herbie Hancock, Keith Jarrett, Chick Corea e return to forever, Mahavishnu Orchestra, Weather Report, Freddie Hubbard.

1985 – Hoje: Contemporâneo & Ecletismo

Globalização, retorno as raízes e posteriormente, a fusão com hip hop e ritmos do mundo. Referências: Wynton Marsalis, Robert Glasper, Esperança Spalding, Kamasi Washington.

Miles e Coltrane (créditos: reprodução/revista santiago)

 O jazz e o seu legado

O jazz permanece pulsando e é um patrimônio vivo da humanidade, ocupando um papel singular no mundo ao expressar uma realidade social, cultural e política, por meio da improvisação e do diálogo coletivo. Ele é um verdadeiro laboratório da democracia, onde cada nota representa a independência e cada acorde simboliza o respeito mútuo. Esse equilíbrio entre liberdade, criatividade e respeito, faz do jazz um catalisador de transformações culturais, capaz de inspirar movimentos sociais, fortalecer identidades e romper fronteiras. Parafraseando, Martin Luther King; “o jazz representa a afirmação de uma dignidade, é o grito de liberdade de um povo”.

Duke Ellington  e sua famosa Orchestra 1938 (créditos: reprodução/the mann center)

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