Bordado é cultura, sustento e resistência 

Foto capa: Contioutra

Por Laryssa Leite

O bordado, embora carregue traços estéticos delicados, representa uma economia significativa e um patrimônio cultural vivo no Brasil. Em muitos territórios, especialmente nas regiões Nordeste e Sudeste, o ato de bordar resiste como prática ancestral, herdada de mulheres que costuravam não apenas imagens sobre o tecido, mas também a própria história das comunidades. Em estados como Minas Gerais e Ceará, mulheres mantêm o ofício praticado há décadas, mesmo quando desafios sociais e econômicos se acumulam em seu caminho. 

Ao longo do tempo, o bordado foi deslocado para os domínios do doméstico e do invisível. Mas ao invés de desaparecer, ele se adaptou, se organizou em redes e se tornou também um recurso de sobrevivência. Grupos comunitários passaram a transformar esse saber em fonte de renda, autonomia e pertencimento. Em zonas rurais, associações e coletivos femininos compartilham técnicas, experimentam novas linguagens visuais e, sobretudo, mantêm vivos vínculos intergeracionais. 

Um exemplo concreto é o grupo Meninas de Córregos, no distrito de Conceição do Mato Dentro (MG). Com o apoio da prefeitura local, da Emater e da mineradora Anglo American, oito mulheres se reúnem quinzenalmente para bordar, criar moldes e trocar saberes. A iniciativa busca atrair o interesse de jovens da comunidade, ao mesmo tempo que propõe o bordado como ferramenta de valorização cultural e econômica. Ali, os fios não apenas costuram tecidos, mas reafirmam o papel das mulheres como guardiãs da memória local. 

Marli de Sousa Reis, moradora de Córregos e idealizadora do projeto. Créditos: Júlia Militão

Também na zona rural mineira, a Associação Linhas de Minas, em Lima Duarte, reúne cerca de 20 mulheres que combinam bordado livre com cestaria feita a partir de fibras naturais como a taboa e a bananeira. Os temas dos bordados são, em si, um gesto de preservação ambiental: pássaros, folhas, flores e cenas do cotidiano rural conectam as bordadeiras à terra, à ancestralidade e ao seu entorno. Cada peça carrega um fragmento da paisagem e da sensibilidade coletiva da região. 

Dona Denise Maria mostra com orgulho o seu trabalho. Foto: Celine Billard 

Outro destaque vem do Ceará, onde o grupo Bordadeiras do Jardim, no bairro Jardim das Oliveiras em Fortaleza, reúne mulheres em situação de vulnerabilidade social que transformam o bordado livre em ferramenta de empoderamento e expressão. Com apoio da Central de Artesanato do Ceará (CeArt), o grupo promove oficinas, acesso a feiras e capacitações, gerando renda e fortalecendo a identidade coletiva dessas mulheres. 

Com linhas de cores vivas, essas mulheres costuram suas histórias no tecido de chita. Foto: Beatriz Sousa

Esses grupos demonstram como o bordado transcende o âmbito doméstico. Transformam a prática manual em plataforma de valorização cultural e empoderamento feminino. Também provam que o ponto não é apenas uma expressão estética, mas uma ferramenta de resistência política, consolidação comunitária e afirmação de identidades. 

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