Foto capa: Mark Von Hoden/The Academy
Por Guto Neto
Após décadas de lutas por visibilidade e investimento, o cinema brasileiro vive, em 2025, um dos momentos mais vibrantes de sua história. Entre prêmios inéditos, recordes de público e o reconhecimento da crítica internacional, surge uma pergunta inevitável: estaria o Brasil, finalmente, consolidando sua indústria audiovisual?
A resposta se desenha entre números robustos, conquistas simbólicas e uma produção cinematográfica que tem sabido dialogar tanto com as grandes questões políticas quanto com o imaginário popular.
A maior conquista recente veio de Hollywood. Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles, tornou-se o primeiro filme brasileiro a vencer o Oscar de Melhor Filme Internacional. Protagonizado por Fernanda Torres — também indicada à estatueta de Melhor Atriz —, o longa narra a trajetória de Eunice Paiva durante os anos de chumbo da ditadura militar. Com roteiro premiado no Festival de Veneza e mais de 5 milhões de espectadores no Brasil, o filme une qualidade artística, relevância histórica e apelo comercial.
Em Berlim, o diretor Gabriel Mascaro brilhou com O Último Azul, que venceu o Urso de Prata ao abordar, com linguagem inovadora, um Brasil distópico, poético e urgente.
Já no Festival de Cannes, O Agente Secreto, de Kleber Mendonça Filho, foi o grande nome latino-americano do evento. A produção arrebatou o Prêmio da Crítica Internacional (FIPRESCI), o troféu de Melhor Direção e consagrou Wagner Moura como Melhor Ator, confirmando a força criativa e técnica do cinema nacional.
A consagração foi coroada com uma homenagem inédita: o Brasil foi escolhido País de Honra do Marché du Film, o principal mercado audiovisual do mundo, abrindo novas portas para coproduções e investimentos internacionais.
No Brasil, o impacto dessas produções também se traduz em bilheteria. Entre janeiro e abril de 2025, o número de espectadores de filmes nacionais cresceu 15% em relação ao mesmo período de 2024. Foram mais de 8,3 milhões de ingressos vendidos para produções brasileiras, representando quase 30% da bilheteria total do país — um feito notável diante da hegemonia dos blockbusters estrangeiros.
Filmes como O Auto da Compadecida 2, Chico Bento e a Goiabeira Maravilhosa e Vitória também se destacaram, mostrando que o cinema brasileiro é capaz de falar com diferentes públicos, sem perder identidade.
Os números do setor impressionam. De acordo com a Ancine e consultorias especializadas, o audiovisual brasileiro emprega mais de 657 mil pessoas, entre diretos e indiretos. Só no Rio de Janeiro, o setor movimentou R$ 4,2 bilhões em 2023, gerando mais de 20 mil empregos formais.
Apesar dos avanços, a estrutura da indústria ainda é frágil. Em 2023, os filmes brasileiros representaram cerca de 40% dos lançamentos, mas apenas 3,5% do público total. A distribuição limitada, o baixo investimento em divulgação e a concentração de salas em grandes centros urbanos ainda dificultam o alcance nacional das produções.
Políticas públicas como o Fundo Setorial do Audiovisual e o programa PERSE têm papel central nesse cenário, mas exigem continuidade, desburocratização e visão estratégica para alcançar todas as regiões e agentes do setor.
Mais do que prêmios e bilheteria, o que se coloca para o cinema brasileiro em 2025 é a chance de construir um sistema audiovisual sólido, diverso e sustentável. Isso passa por formação técnica, acesso a financiamento, fortalecimento da cadeia produtiva, ampliação das salas e internacionalização dos talentos e conteúdos.
A visibilidade conquistada por filmes como Ainda Estou Aqui, O Último Azul e O Agente Secreto é um passo. Mas, para que essa fase não seja apenas uma exceção histórica, é preciso estruturar o setor como política de Estado e projeto de país.
Se o passado recente do cinema brasileiro é marcado por resistência e criatividade, o presente é de reconhecimento. Agora, o desafio é garantir um futuro com protagonismo, autonomia e permanência.
O Brasil está em cena. E o mundo está assistindo.
