Foto de Capa: Reprodução
Por Maria Luiza Queiroz
A língua portuguesa está em mutação a todo momento, acompanhando a evolução constante em que nos encontramos. A nova discussão que cerca o português é a introdução dos pronomes neutros na nova forma de nos comunicarmos, nas redes sociais. O debate sobre o tema é extenso e complexo, mas afinal do que se trata a neutralização dos pronomes e quais são as barreiras para sua inclusão em nossa língua natal.
O pronome neutro busca criar uma terceira opção para os pronomes, além do feminino e o masculino, exercendo um papel fundamental na luta das pessoas que não se identificam com nenhum dos gêneros, chamadas de não binárias, que se mostram invisibilizadas pela atual forma que os pronomes se apresentam na nossa língua. Nas redes sociais há um grande movimento para esta inclusão, porém ao longo deste percurso houve alguns impasses.
As primeiras tentativas de inserir a linguagem neutra no cotidiano foi usando o “x” no lugar do “o” e do “a” nos pronomes, entretanto usar o “x” causa exclusão a pessoas com deficiência visual e também houve a dificuldade em trazer esse método para fora da internet, já que não havia uma pronúncia que se adequasse à escrita. Outras formas de incluir o pronome neutro foi inserindo o “e” em final de palavras terminadas em “o” ou “a”, como por exemplo: “amigue”; conhecide” e “apaixonade”, entretanto a solução para substituir o ele ou ela, foi “elu”, que é forma mais utilizada atualmente nas redes sociais.
Contudo é difícil aplicar de forma simples o pronome neutro em nosso idioma, muitas são as problemáticas que envolvem esta mutação da língua portuguesa. Sabemos que qualquer modificação no idioma leva um tempo longo para adaptação, a exemplo da reforma ortográfica de 2009, que busca unificar a linguagem dos oito países que utilizam o português, a reforma não foi extensa e ainda assim, gerou confusão, logo previsível que haja divergências a uma mudança tão drástica nos pronomes.
Outra grande polêmica sobre o tema é como sair da ortografia e aplicar o pronome neutro no cotidiano de comunicação de todas as camadas sociais, principalmente aquelas que não têm acesso às redes onde o pronome neutro é utilizado com mais frequência. A busca pela inclusão dos pronomes vai da internet até o meio acadêmico no qual as opiniões também divergem, já que alguns creem que a língua portuguesa já é neutra e não precisa de uma mutação e outros que apostam que uma reforma gradual é a melhor forma de incluir todos em nosso idioma. Certamente não é uma discussão rasa, logo não deve ser ignorada.

Em entrevista feita através de uma rede social, Dante de Moraes Alves, acadêmique de Letras, Língua e Literatura Portuguesa, na Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e também atuante no desenvolvimento de pesquisas independentes sobre a neolinguaguem, respondeu algumas perguntas, a fim de sanar algumas dúvidas em relação a nova forma de nos comunicarmos.
Qual a importância da linguagem neutra para inclusão de todos na nossa sociedade?
A Neolinguagem, também denominada como Linguagem não-discriminadora de gênero, ou Linguagem não-binária, ou ainda Linguagem neutra – como empregado na pergunta -, tem como alicerces, podemos dizer assim, a inclusão e a representatividade, e é uma possibilidade, uma alternativa de aplicação. Possuir uma comunicação voltada à pluralidade dos seres é o que se idealiza dentro desse mecanismo de linguagem. Não é somente sobre revogar o marcador de gênero masculino genérico dentro da Língua Portuguesa, mas também é sobre entender o porquê dele ser o principal marcador aplicado nos mais diversos ambientes, daí tem-se também a discussão quanto ao sexismo linguístico. Acima de tudo, é sobre questionar e refletir acerca das estruturas gramaticais – considerando a gramática normativa -, assim como estruturas sócio-político-culturais presentes, é claro, na sociedade em que vivemos.
Você acredita que a Língua Portuguesa precisa da inclusão do pronome neutro?
Antes de responder, vale pontuar que não é somente sobre pronomes, quando estabelecemos isso, limitamos a discussão a uma classe gramatical, o que não é o caso. Logo, respondo essa pergunta substituindo o então grafado “pronome neutro” pelo termo que acredito ser mais apropriado, e até mesmo mais abrangente, quando discutimos essa temática: Neolinguagem. Dito isso, segue o seguinte raciocínio: quando tratamos sobre a Língua Portuguesa, idealiza-se algo quase Institucional, a Língua Materna, a Gramática, e por aí vai, mas acabamos esquecendo que a Língua está mais para a fala do que para a escrita, isto é, a gramática de uma Língua não é a própria Língua. O que quero dizer é que quem necessita da Neolinguagem são as pessoas que assim a utilizam no seu cotidiano, mas também àquelas que serão bonificadas através das reflexões existentes por causa desse movimento, e não a Gramática em si. Ao tratarmos a Língua como um produto social, entende-se que as pessoas que compõem essa comunidade linguística possuem necessidades de interação, através disso cria-se possibilidades de comunicação, e é aí que apresenta-se a tal da “necessidade” de uma linguagem mais inclusiva e que represente o plural do existir. Isto é, a Língua é um fator sócio-cultural.
Na sua opinião, é uma implementação possível em nossa sociedade?
Não só é possível, como já está sendo implementada. Assim como qualquer outro tipo de linguagem ou fenômeno linguístico, tudo depende de conversão social, isto é, requer-se que um número – expressivo – de falantes passe a utilizar no seu dia-a-dia a neolinguagem para que haja aceitação e normalização no meio social que estão presentes. A adaptação de termos linguísticos é diferente quando tratamos de escrita e fala, visto que são duas vertentes distintas – que se correlacionam – nos seus mais diversos aspectos. Ainda sim, é possível que haja ao longo do tempo uma crescente movimentação para que a utilização dessa linguagem se torne mais comum.
Há outras formas de neutralizar a linguagem, sem precisar incluir o pronome neutro?
Existem sim meios de neutralizar uma sentença sem fazer uso de marcadores de gênero – indo pelo aspecto social -, a nossa Língua possui diversas ferramentas para tal feito, a exemplos de palavras como “pessoa”, “gente” ou “pessoal” (“Boa tarde, pessoal!” substituindo “Boa tarde a todos!”). Acontece que na oralidade não nos apegamos tanto as idas e vindas do discurso, queremos ser mais breves possíveis, o que dificulta um tanto essa colocação de termos, mas isso não chega a ser um problema. Tudo questão de prática e costume.
Quais são as principais dificuldades para incluir o pronome neutro em nossa língua materna?
Existem particularidades quando abordamos mudanças linguísticas, nesse caso, trata-se de alteração na estrutura, não é como se fosse a implementação de uma gíria ou de um estrangeirismo na nossa Língua, o que torna o processo lento e gradual, não será de um dia para a noite que teremos a aceitação desse modelo de linguagem. A conversão – principal meio de implementação -, como já dito, depende, sobretudo, do número de falantes, assim como da utilização tanto na escrita, mas principalmente quanto na oratória, por se manifestar de modo mais natural pela fala.
Há ainda aquelas pessoas que se posicionam contra, assumindo uma postura purista, mas essas esquecem que ao longo dos tempos ocorreram diversas mudanças e variações linguísticas, palavras foram sendo criadas e outras foram caindo em desuso, isso não desfalcou a Língua Portuguesa, na verdade, entendemos que a nossa Língua – assim como as demais – está passível de transformação a todo momento justamente por estar inserida na sociedade, visto que é viva e dinâmica, adaptando-se de acordo com a necessidade de cada falante – em âmbito individual ou coletivo.
Além disso, discussões relacionadas a tópicos linguísticos costumam demandar tempo, e não diferente a respeito da Neolinguagem, sobretudo por ainda estar sendo fundamentada teoricamente através de estudos, e pesquisas – em sua maioria independentes. Por possuir atravessamentos, estes relacionados aos movimentos sociais, é necessário que haja inteligência e estratégia, de certa forma, em sua abordagem. Os métodos de ensino precisam ser revisados e adaptados, o público-alvo precisa ser estudado por quem se coloca na posição de ensinar, e a comunicação precisa ser efetiva. Falando assim até parece que há compactuação com o que algumas pessoas pensam de ser uma linguagem elitista – esses sensos comuns também entram na lista de dificuldades a serem enfrentadas -, mas muito pelo contrário, essa questão é “facilmente” resolvida com o tempo, com possibilidades, com oportunidades, com aberturas e com ocupações de espaços antes negados ou não pensados.
Não é de hoje que se pondera sobre uma linguagem mais inclusiva, e o conforto está em saber que essa problematização não cessará tão cedo, não é um tópico fechado.
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que maravilha! texto extremamente esclarecedor e matéria super importante
gratidão por este trabalho 💜
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Não contribuiu em nada.
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Besteira
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A proposta de pronomes neutros não está de acordo com a maioria da comunidade LGBTQIA+. A própria comunidade se divide em dezenas de letras. São pessoas que estão lutando justamente pra serem reconhecidos no pronome correto e não novamente serem excluídos, sendo tratados como pronome neutro.
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Tenho gostado do pronome neutro, principalmente usando o “x”, porque parece com uma possibilidade de colocar a letra que você quiser, como na matemática onde “x” é uma variável. Ainda estamos aprendendo a usar a língua e o respeito então, vai levar um tempo para aprendermos a usar o pronome neutro como deve ser.
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Só Brasil mesmo para a aceitar essas brincadeiras
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Finalmente encontrei um site que explica tudo correto, e sem qualquer tipo de preconceito. Inclusive vou sugerir que nas aulas de português a professora aborde sobre o tema e vou sugerir esse site.
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gostei muito desse texto, e acho que explicou muito bem sobre o pronome neutro. muito provavelmente esse tema vai ficar cada vez mais conhecido. e isso é muito bom, na verdade. é bom que isso se torne cada vez mais uma coisa comum. é irritante ficar sendo chamado de ele dele, mesmo sendo um menine agenero. obrigado pelo texto.
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Não só acho importante, como acho também vital para a sobrevivência das pessoas que se encontram excluídas e violentadas pela sociedade hetero normativa que tem como motor o ódio e discriminação contra quem é “diferente”, desde de menor eu enfrento o problema de me identificar como um Alien do omnitrix e ser taxado muitas vezes de paranóico, é triste demais essa situação mas após esse texto eu vejo uma luz no túnel, abraços!
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Não se trata apenas de alterações no campo morfológico, mas de um embate que envolve inclusão e luta contra a segregação. A linguagem, portanto, serve a esse propósito.
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A letra “o” ja é um pronome neutro, so procurar sua origem do Latim, nada tendo a ver com homem do sexo masculino 🤦🏻♀️
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mas no português o (O)é utilizado como pronome masculino tipo , o luiz vai lá na casa do pai dele.
o (o) foi ultilizado de forma com que se destacasse o pronome masculino
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Não seria mais fácil falar: Boa tarde a todas e a todos? Não entendi. Todes, hoje, é uma palavra que não existe, e que seria mais fácil as pessoas usarem o que o pesquisador sugeriu, pessoal, gente, galera ou todos e todas!
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assim, galera e gente pode ser ultilizado como pronome neutro mas todos e todas não pois o todos(masculino)todas(feminino) a linguagem neutra tem o objetivo de incluir todos os pronomes e tals
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Uma grande frescura , o que vai mudar no mundo?
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gostei muito do texto bem completo obrigade a todes .
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