Por Idries Bulkool Bernstein
Uma partida de futebol vem normalmente atrelada ao torcedor na arquibancada, lotando estádios para apoiar seu time, seja qual for o momento. Contudo, dentro de uma nova realidade de incertezas quanto ao fim da pandemia, a espera de uma vacina em definitivo para o novo coronavírus coloca o futebol em um momento particular com a pandemia.
Com um maior controle na questão sanitária, o futebol retornando, terá que adaptar jogos e campeonatos a um cenário constante de estádios vazios, gerando um impacto, não somente financeiro, como também quanto ao desempenho dos times dentro de campo. Na Europa, após um longo período de pausa, a volta dos campeonatos serve como um bom exemplo para observar o que a falta de espectadores pode causar na atuação dos times. Nesse sentido, analisamos três, dos campeonatos europeus, que voltaram e já se encerraram, para perceber algumas particularidades.
Bundesliga – Alemanha

Com os estádios vazios, muito se diz sobre o impacto que a falta da torcida pode ter no jogo que se apresenta em campo. Nesse sentido, a primeira divisão do campeonato alemão, a Bundesliga, pode servir como um bom exemplo desse novo normal nos estádios, visto que sua média de público gira em torno de 43 mil torcedores por jogo, antes da pandemia do novo coronavírus, como indica um levantamento feito pelo site de apostas Betsul entre os anos de 2013 e 2018.
Realizou-se uma comparação entre os aproveitamentos dos times da última edição da Bundesliga, considerando o momento antes da pandemia, quando as torcidas enchiam os estádios, e sua retomada, dessa vez sem a presença do torcedor. Se, de maneira geral, a parada foi pior para os times da parte de cima da tabela, outros aspectos também podem ser destacados.
Os times mandantes, que tinham um baixo aproveitamento (50,37%) antes da parada, viram seu rendimento cair ainda mais, em torno de 39%. Fato esse que está diretamente relacionado à média de gols marcados após a retomada, que ficou apenas em 1,27 gol por jogo, o que antes era de 1,64 gol. Em entrevista ao Estadão, o atacante do Wolfsburg, Victor Sá, declarou: “Querendo ou não, a torcida é um grande fator para quem joga em casa. Na Alemanha, os estádios são todos cheios, o incentivo da torcida é um gás a mais. E isso pode estar fazendo falta”.
Podemos dizer que a falta de torcida nos estádios para apoiar e empurrar os times foi, por outro lado, positiva para os mandantes, que se sentiram menos pressionados e puderam trabalhar sua forma de jogo sem uma multidão de pessoas torcendo contra. Esse pensamento pode ser visto na fala do técnico do Bayer Leverkusen, Peter Bosz, em entrevista à Folha de São Paulo: “Eu não acho que seja uma coincidência. É mais fácil para os times visitantes quando não há torcedores no estádio. Sem torcida, o jogo fica mais resumido à qualidade dos jogadores”.
La Liga – Espanha

Outro estudo feito pelo Betsul, dessa vez analisando as mudanças na primeira divisão espanhola, a La Liga, trouxe algumas características em comum. No caso espanhol, as equipes mandantes também viram seus desempenhos caírem após a retomada do campeonato. O aproveitamento foi de 57% antes da pausa para 50% no período de jogos sem a torcida.
Assim como na Alemanha, esse rendimento vem atrelado ao desempenho dos times como mandantes no período pós pandemia. A média de gols que o time da casa marcava antes da parada era de 1,54 gol por jogo, passando para apenas 1,29 gol no período posterior. Basta observar que, dos 20 times, apenas quatro deles conseguiram marcar mais gols depois da pausa.
Inversamente proporcional, se os times como mandantes caíram em aproveitamento, ao visitar outras equipes tiveram uma melhora considerável. O Barcelona passando de 46,20% para 77,78% e o Real Madrid pulando de 59,50% para 86,67%, assim como 10 outros times conseguiram aumentar os pontos conquistados fora de casa.
Por fim, o período parado serviu para um retorno mais equilibrado, com oscilações na parte de baixo, do meio e de cima da tabela. No caso espanhol, em especial, é importante destacar os gols sofridos. Times que conseguiram diminuir os gols sofridos, melhorando o setor defensivo, se saíram melhor depois da parada.
Premier League – Inglaterra

O último exemplo de campeonato que já se encerrou foi a Premier League, primeira divisão do futebol inglês, que serviu para tirar outras observações sobre a falta de torcedores nos estádios. Nesse caso, em especial, a torcida acabou não tendo um impacto tão grande nos resultados apresentados em campo. Entre o período antes e depois da pausa, os mandantes tiveram, em geral, um desempenho apenas 0,86% melhor. Esses não sentiram tanto a parada, assim como os visitantes não puderam triunfar mais fora de casa, tendo um desempenho similar ao período.
Quanto aos gols marcados e sofridos, pouca variação tampouco. Os mandantes marcavam 1,51 gol e conseguiram aumentar a média para 1,54 gol por jogo nas rodadas finais. A melhora nos gols sofridos, de 1,23 para 1,17 gol, também mostra a constância no desempenho, o que explica o aproveitamento superior dos times jogando em casa.
Em suma, no Inglês percebeu-se uma polarização entre a parte de cima e de baixo da tabela de classificação. Para os 10 primeiros, com algumas exceções, o aproveitamento melhorou, assim como gols marcados aumentaram e sofridos diminuíram. Já para os 10 últimos colocados, a realidade se inverte, pois, tirando poucos times, esses não conseguiram melhorar seus rendimentos, tampouco os gols marcados e sofridos.
É importante considerar que a falta de torcedores apoiando os times não é o único fator que pode afetar o desempenho das equipes. Cumprir o calendário previsto às pressas acarreta o aumento da quantidade de jogos em um menor espaço de tempo. Com isso, a intensidade e qualidade dos jogos não é a mesma, além das chances de lesões serem mais altas.
Por fim, o fato de se jogar futebol em meio a um período de pandemia não é fácil. As incertezas da volta do público e do calendário regular, os rígidos protocolos sanitários, o medo de se infectar ou ainda que algum conhecido venha a se contaminar. Tudo isso em meio a um ambiente que demanda foco e concentração constante. Cabe aos jogadores conseguirem superar não só a falta de torcedores nos estádios, como também as inseguranças que a pandemia os coloca.