Direitos indígenas fundamentais sob ameaça

Foto de Capa: Marcello Casal Jr./Agência Brasil (19/04/2019)

Por Breno Braga

Nesse 19 de abril, o dia dos povos indígenas foi marcado pela luta. Um grupo de 100 indígenas vacinados contra a Covid-19 e seguindo os protocolos sanitários, marchou em Brasília erguendo as faixas “Fora Bolsonaro” e “Demarcação já”. O protesto teve como alvos o Projeto de Lei (PL) 191/2020 que regulamenta a exploração de recursos minerais, hídricos e orgânicos em reservas indígenas e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000 que impede o reconhecimento dos territórios tradicionais. 

O PL 191 foi encaminhado ao Congresso pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em fevereiro do ano passado e está em uma lista prioritária entregue aos atuais presidentes da Câmara e do Senado, conforme documento revelado pelo jornal Valor em 03 de fevereiro de 2021. A lista também inclui um projeto de lei que facilita o licenciamento ambiental e outro conhecido como PL da Grilagem. 

Nossa atual Constituição Federal contou com ampla participação dos povos indígenas em seu processo constituinte, nos anos 1987 e 1988, o que garantiu o reconhecimento dos seus direitos e o desenvolvimento de políticas públicas para proteção e demarcação de suas terras. No período anterior à redemocratização, durante os 21 anos de ditadura militar, os indígenas sofreram massacres, remoções forçadas de seus territórios, contágio por doenças infectocontagiosas, prisões, torturas e maus tratos, resultando em ao menos 8.350 mortes, conforme apuração da Comissão Nacional da Verdade (CNV).  

De acordo com o Censo Demográfico realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população indígena no Brasil é composta por 896.917 pessoas de 305 etnias. A cada dez anos é feito um novo levantamento, mas no ano passado ele foi adiado por causa do surgimento da pandemia de Covid-19. Esse ano, o corte no orçamento do IBGE, já sancionado pelo Presidente da República, tornou inviável a realização do Censo 2021, e o concurso que contrataria agentes censitários e recenseadores para fazer o trabalho teve que ser cancelado. 

A Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão coordenador da política indigenista que tem a missão de proteger e promover os direitos dos povos indígenas no Brasil, vem sofrendo um “enfraquecimento crônico da força de trabalho”, de acordo com avaliação feita em 2015 pelo Tribunal de Contas da União (TCU).  O Decreto 9.711/2019 contingenciou 90% do orçamento da Funai e em 2020 os gastos destinados para saúde indígena tiveram queda de 13% em relação a 2019, segundo o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Além disso, o presidente Jair Bolsonaro promoveu a troca de comando na estrutura da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), e agora as 34 unidades do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) estão sob a coordenação de pessoas sem conhecimento técnico e experiência na área, de acordo com a Agência Repórter Brasil. 

Atuando como uma rede de proteção social, a Comissão Arns e o Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu) denunciaram Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional de Haia em novembro de 2019 por incitar o genocídio e promover ataques sistemáticos contra os povos indígenas do Brasil. Em 13/04/21, a ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia pediu que fosse marcado o julgamento de uma notícia-crime apresentada contra o presidente Bolsonaro por suspeita de genocídio contra indígenas na pandemia do novo coronavírus, depois que ele vetou trecho de lei para assistência a indígenas durante a crise sanitária, que previa garantia de fornecimento de água potável e insumos médicos. 

O Instituto Socioambiental em parceria com a Articulação dos povos indígenas do Brasil (Apib) lançou em 03/04/21 uma plataforma para monitorar o avanço da pandemia nas Terras Indígenas e municípios próximos a elas. Até o dia 26/04/2021 já foram confirmados 52.997 casos em 163 povos e 1.048 vidas perdidas. 

Além da ameaça da Covid-19, o desflorestamento na Amazônia segue batendo recordes como mostra o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. No ano de 2018 foram 4.951 km2, em 2019 chegou a 9.178 km2 e 2020 teve 8.426 km2 de área desmatada. 

Morador da cidade do Rio de Janeiro há 25 anos, o cacique Carlos Tukano é presidente do Conselho Estadual dos Direitos Indígenas (Cedind) e foi uma das lideranças da Associação Aldeia Maracanã. Ele relatou que a sua tribo de origem, localizada em São Gabriel da Cachoeira na fronteira do estado do Amazonas com a Colômbia, teve casos de Covid-19 devido ao intercâmbio com Manaus, e demonstrou indignação com o “desmantelamento das políticas públicas”. O cacique lamentou as mortes dos povos da floresta durante a pandemia: “Perdemos muitas vidas, várias lideranças se foram. Nós não temos imunidade para sobreviver a um vírus como esse”. 

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