Por Cadu Guarieiro
O dia 17 de Abril é o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária. Data instituída pela Lei nº10.469/2002, que reivindica o direito à terra e homenageia as vítimas do massacre de Eldorado dos Carajás, município do Pará, em 17 de abril de 1996.
A chacina executada pela Polícia Militar do Estado do Pará a mando do então governador Almir Gabriel (PSDB), do secretário de segurança Paulo Sette Câmara e do presidente do Instituto de Terra do Pará, Ronaldo Barata, resultou na morte de 19 trabalhadores sem-terra acampados na “Curva do S”, trecho da rodovia PA-150. Os camponeses caminhavam à capital, Belém, cobrando atitudes do governo do estado sobre a expropriação da Fazenda Macaxeira, dada à displicência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) com a situação.
A ação teve repercussão internacional principalmente por tamanha violência, ao menos dez das vítimas foram mortas com tiros à queima roupa, e outras sete mortas por instrumentos cortantes como foices e facões, ainda que resistindo apenas com paus e pedras, sem o uso de armas de fogo, informa o Memorial da Democracia.
“Primeiro a ocupação, que desemboca em um acampamento, que as famílias vivem em um latifúndio ilegal, na tentativa de Reforma Agrária daquele local”
Tifhanny Flor de Lua
De acordo com o Estatuto da Terra, Lei nº 4.504/1964, considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visam promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de entender os princípios de justiça social e o aumento de produtividade.
Em um país de tamanha desigualdade como o Brasil, a política pública voltada para a questão de terras é de suma importância, em 2019, um estudo da Oxfam Brasil – organização voltada para estudos sobre desigualdades – analisou que menos de 1% das propriedades agrícolas detém quase metade (45%) da área rural brasileira.
Muitos movimentos populares lutam contra a concentração fundiária, entre eles a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) e o Movimento de Luta pela Terra. O mais popular destes é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Fundado em janeiro de 1984, no 1º Encontro Nacional de Trabalhadores Sem Terra, em Cascavel, no Paraná, como uma frente de oposição à proposta de reforma agrária pela Ditadura Militar, voltada à colonização de terras devolutas em regiões remotas, que de acordo com os sem-terra ainda que se anunciasse como um projeto de modernização, era um estímulo ao uso massivo de agrotóxicos e mecanização, baseado em créditos rurais e exclusivos ao latifúndio.
O Armazém do Campo, é uma franquia de lojas espalhadas pelo Brasil, que comercializam alimentos agroecológicos livres de agrotóxico, produtos de saúde e artesanatos produzidos por acampados e assentados do MST, o local também funciona como um espaço de cultura e educação, promovendo cursos, festas e saraus.

O Armazém, localizado no Centro do Rio de Janeiro, tem 4 anos, e como todos os outros espalhados pelo Brasil está vinculado ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST, mais especificamente ao setor de produção, que articula as colheitas e os produtos de acordo com a especificidade de cada região do país.
Tifhanny Flor de Lua, trabalhadora do Armazém do Campo do Rio de Janeiro, conta que “não há como plantar tudo em qualquer região, o setor de produção pensa nesta direção. O Movimento se estrutura nesta linha: primeiro a ocupação, que desemboca em um acampamento, que as famílias vivem em um latifúndio ilegal, na tentativa de Reforma Agrária daquele local”.
Fora as individualidades que dificultam o plantio, as temperaturas do mercado financeiro são o maior obstáculo para a gestão do ambiente, afirma Tifhanny. As quantidades de produtos comprados pelo armazém precisam ser bem calculadas, tendo em vista que a validade – por não ter conservantes – é bem menor dos que os presentes no supermercado, somada à essa questão há o valor agregado sobre a mercadoria que é influenciada pela quantia repassada para os produtores acampados e assentados, e pelos fretes, resultando em um produto de valor, porém com um preço que os consumidores em grande parte das vezes não compreende.

Ainda que passados 27 anos do Massacre de Eldorado dos Carajás, Tifhanny, que por 15 anos morou em Marabá, aproximadamente 100 quilômetros de Eldorado dos Carajás, enfatizou os perigos ainda existentes para os sem-terra, desde os sistemas públicos, principalmente de cidades pequenas e afastadas, cooptados de maneira corrupta por fazendeiros, resultando na expulsão de famílias acampadas, até ações mais ostensivas, como envenenamento dos poços de água dos acampamentos e assentamentos, ou a pulverização de agrotóxico sobre as colheitas com o uso de aviões, resultando em alergias e queimaduras sobre a pele dos trabalhadores do movimento.
“O fazendeiro, que tem dinheiro, ele tem muita moral, não é só uma Hilux, não é só um carro grande, é toda uma condição de mandar em pessoas, toda uma condição de conhecer o prefeito. A pessoa que tem uma terra ilegal, ela comprou o cartório, ela compra juíz, ela compra o delegado, ela compra quem ela quiser, então por mais que gatilhos não sejam apertados e balas não sejam disparadas, ainda perdemos na luta institucional. (…) Quem está no Movimento Sem Terra tem essa compreensão, de que vivo por mim e faço pelos outros também”.

O Armazém do Campo do Rio de Janeiro fica localizado na Av. Mem de Sá, 135, na Lapa, e funciona de quarta-feira à sexta-feira de 10h às 17h30, e sábado de 09h às 15h30, nos dias de evento, o funcionamento tende a se prolongar, e todos eles são divulgados através do Instagram @armazemdocampo.rio. Para conhecer melhor o espaço, seus produtos ou até efetuar compras há o site do armazém que disponibiliza preço e imagem das mercadorias.
Outras cidades do Brasil também possuem seus Armazéns do Campo, como São Paulo, Belo Horizonte, Imperatriz e Vitória.