Paula e Tessa de Carvalho: irmãs promissoras versus a falta de apoio no nado artístico brasileiro

Foto de capa: Rafael Cruz/Octavio Neto

Por Matheus Hartmann 

Na primeira Olimpíada em que o Nado Artístico, antes conhecido oficialmente como Nado Sincronizado, marcou presença – Los Angeles (1984) – o Brasil foi representado pelas jovens atletas do Fluminense, Paula e Tessa Carvalho de 19 e 17 anos respectivamente. As irmãs foram comandadas por Magali Cremona. 

Foto: Acervo O Globo, 5 de junho de 1984, Jornais de Bairro, pág.9 

A formação de duplas por pessoas da mesma família é comum no esporte, provavelmente pelo entrosamento que se adquire desde cedo. O Brasil teve outras duplas formadas por irmãs, como Beatriz e Branca Feres; e Isabela e Carolina de Moraes. 

Desafios e conquistas nas piscinas 

O esporte foi, inicialmente, levado como um hobby entre as nadadoras brasileiras. A transição de lazer para competitividade só ocorreu no fim dos anos 1970, enquanto Canadá e Estados Unidos tinham duas décadas de experiência. Ou seja, o que Paula e Tessa tinham de idade, outras atletas norte-americanas tinham de carreira na modalidade.  

As irmãs começaram ainda na adolescência nas piscinas do Fluminense. Sem perder muito tempo, foram participando de competições adultas internacionais e nacionais, inclusive conquistando algumas medalhas em campeonatos no exterior.  

O segundo lugar de Paula no Torneio Internacional de Loano, em 1987 na Itália, surpreendeu até mesmo os dirigentes brasileiros. Além do desempenho da irmã mais velha na categoria solo, teve um bronze no dueto e mais uma prata na equipe, que contava com Tessa. Fora o sucesso nesta competição preparatória para o Pan-Americano de Indianápolis (1987), as irmãs estiveram na equipe que conquistou campeonatos sul-americanos na década de 1980, um segundo lugar no Torneio Internacional de Palma de Mallorca, quinto lugar no Pan-Americano de Caracas (1983), além de 11° lugar nas Olimpíadas de Los Angeles (1984).  

Foto: Acervo O Globo, 9 de outubro de 1984, Jornais de Bairro, pág. 5 

Após os Jogos Olímpicos de 1984, houve uma alta na procura pelo então ‘nado sincronizado’, devido, justamente, à participação de Paula e Tessa de Carvalho em Los Angeles. O evento gerou mais popularidade no estado de São Paulo, criando até uma rivalidade com clubes do Rio de Janeiro que já estavam estruturados há algum tempo, caso de Flamengo e Fluminense.  

Estas disputas passaram a ser significativas para um possível crescimento da modalidade no país, o que poderia acarretar um aumento notório de praticantes e federações incorporadas ao esporte em nível nacional.  

No entanto, boa parte das novas ingressantes da modalidade acabaram não levando o esporte a sério. Além da falta de perspectiva e investimento à altura, uma certa romantização do esporte afastou muita gente, pois toda a leveza e plasticidade que o nado artístico transmite quando assistido, na verdade, é resultado de muito treino, força e dedicação.  

Descaso no esporte olímpico 

Prestes a partirem para as Olimpíadas de Los Angeles, estavam as irmãs, Paula e Tessa de Carvalho. A primeira com 19 anos, estudante de Educação Física na UERJ e considerada a melhor da modalidade no país. A segunda com 17 anos e estudante de Processamentos de Dados da PUC.  

Juntas, poderiam ser a ‘cara’ desta nova modalidade olímpica nas décadas de 1980 e 1990. A princípio, a receita ideal para investir em atletas com um futuro promissor estava praticamente pronta – jovens, promissoras, conquistando medalhas e ganhando experiência, mas o desfecho foi diferente. 

É de se imaginar que um país emergente como o Brasil pudesse, minimamente, potencializar uma modalidade recém-ingressada nos Jogos Olímpicos. Mas o fato de ser um país com uma elevada concentração de renda pode explicar toda a seletividade e até negligência com o esporte olímpico em nível nacional.  

Não à toa, com o passar dos anos, a falta de apoio ao esporte foi crucial para o afastamento de várias atletas da época. Magali Cremona, a então técnica da Seleção Brasileira, suplicou este apelo por apoio em uma matéria do jornal O Globo de 1988. A situação colocou até a participação nas Olimpíadas daquele ano em xeque.  

Foto: Acervo O Globo, 1 de março de 1988, Jornais de Bairro, pág. 20 

Os sintomas da falta de apoio eram vistos nos números de equipes e atletas que se concentraram apenas no eixo Rio-São Paulo. De acordo com Magali, em 1988, eram apenas cinco equipes – Fluminense, Flamengo, Guanabara e Tijuca no Rio, e o Palmeiras em São Paulo.  

Os afastamentos e desistências ocorriam, principalmente, devido à falta de perspectiva das atletas, que já não eram mais adolescentes e precisavam conciliar a rígida rotina de treinos com estudos, empregos e outras responsabilidades. E uma destas perdas significativas foi Tessa. 

Paula seguiu por mais alguns anos no esporte, participando dos Jogos Olímpicos de Seoul (1988) e de mais outras competições internacionais. A última delas foi um 14° lugar na Austrália, em 1991. 

Assim como muitos esportes olímpicos no Brasil, o investimento e suporte só aparecem depois do resultado. Não deveria ser correto esperar um desempenho ou atleta ‘fora da curva’. A exceção não pode ser a regra. Esta ordem precisa mudar para que mais jovens talentos tenham perspectiva e dedicação exclusiva nas modalidades.  

É possível entender que, mesmo com pouco retorno, Paula e Tessa conseguiram inspirar pessoas a praticarem e perceberem o quão difícil é o Nado Artístico, uma das duas modalidades praticadas, exclusivamente, por mulheres nos Jogos Olímpicos – talvez mais um fator para o descaso. 

A pergunta que fica é: quantos pódios e medalhas Paula, Tessa e uma geração de mulheres deixaram de conquistar devido à falta de apoio ao Nado Artístico? 

Para conferir as participações de Paula e Tessa de Carvalho em competições da Federação Internacional de Natação (FINA), é só acessar o site oficial da federação:  

https://www.fina.org/athletes/1072876/paula-carvalho

https://www.fina.org/athletes/1076382/tessa-carvalho

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